O
Congresso Nacional analisa em duas frentes propostas que criam um Marco
Regulatório dos Jogos no país.
As
propostas preveem a legalização de cassinos, casas de bingo, jogo do bicho e
outras modalidades de aposta hoje proibidas, como as máquinas caça-níquel e os
jogos on-line.
Uma
das propostas está pronta para ser votada no Plenário do Senado (PLS 186/2014)
e outra está sendo discutida por uma comissão especial da Câmara (PL 442/91 e
outros).
Um
dos argumentos para a legalização dos jogos, proibidos no país há 70 anos, é a
crise econômica, com o aumento do desemprego e o rombo orçamentário dos
governos federal, estadual e municipal.
Dentro
dessa ótica, os jogos são vistos como potenciais geradores de empregos e de
arrecadação. De acordo com o Instituto Brasileiro Jogo Legal, que defende a
legalização, os jogos ilegais movimentam R$ 20 bilhões por ano no país.
O
presidente da entidade, Magno Santos de Sousa, calcula que a legalização pode
praticamente triplicar esse valor:
"O Brasil, em 2014, tem um PIB de R$ 5,5
trilhões. Se considerarmos 1%, nosso potencial de mercado de apostas gira em
torno de 55 bilhões e 200 milhões de reais. Se a gente considerar aquela média
de tributação de 30%, nós estamos falando aí numa arrecadação de R$ 16,5
bilhões por ano."
Com
base nesse raciocínio, os deputados discutem duas coisas: qual será a alíquota
dos impostos que os empresários dos jogos terão que pagar e como será
distribuída essa arrecadação.
A
proposta do Senado cria uma contribuição social sobre a receita bruta dos
estabelecimentos, que será de 10% nas casas de jogos e de 20% nos jogos pela
internet. A receita bruta é a diferença entre o que a casa arrecada e o que
paga aos apostadores.
Os
empresários temem que os impostos sejam calculados sobre o lucro líquido, o
chamado giro de apostas, como disse o executivo Mário Assis Ferreira,
presidente do Conselho de Administração do Cassino Estoril Sol, em Portugal:
"Não deve incidir sobre o lucro líquido do
cassino, mas sim sobre a receita bruta gerada pelo jogo. Se refere aos ganhos
efetivos do casino. Ou seja, ao total do valor das apostas, a serem deduzidos
todos os prêmios pagos."
O
Instituto Brasileiro Jogo Legal considera que uma taxa alta pode afugentar os
empresários, como aconteceu na França, onde os cassinos fecharam depois da
imposição de uma taxa de 2% sobre a receita bruta.
Olavo
Sales da Silveira, da Associação Brasileira dos Bingos, Cassinos e Similares,
disse que os bingos, fechados em 2008, eram submetidos a carga muito alta de
impostos:
"O bingo nunca pôde ter transparência. O bingo
não fazia dinheiro como bingo. O bingo fazia dinheiro para pagar seus custos no
estacionamento e nos alimentos e bebidas. Porque, se ele declarasse 10 mil de
receita de bingos, ele tinha 14 mil de impostos para pagar. Isso era
impossível."
Para
o presidente da comissão especial, deputado Elmar Nascimento, do Democratas da
Bahia, uma alíquota muito alta pode tornar os estabelecimentos de jogos no
Brasil pouco competitivos:
"Nós não podemos ter uma alíquota muito grande
aqui, quando em países, até fronteiriços, e do restante do mundo tem uma
alíquota menor, penalizar essa atividade. Isso tem que estar ao mesmo tempo
sintonizado com nosso código tributário nacional. Porque tem diversos impostos
que você não pode abrir mão, a exemplo do PIS, do Cofins, do IPTU, o próprio
Imposto de Renda."
A
questão envolve, também, a partilha desses impostos. O deputado Nelson
Marquezelli, do PTB de São Paulo, defende um mecanismo que permita repasses
para as prefeituras, como acontece com o Fundo de Participação dos Municípios:
"Precisamos ter arrecadação para o estado, para a
União, mas não podemos esquecer dos municípios. E olha: nós não podemos
esquecer daquele município que não vai ter jogo nenhum. Temos que fazer com que
caia no FPM (Fundo de Participação dos Municípios), que caia numa arrecadação,
que seja repartido isso para todos os municípios brasileiros."
As
dúvidas não param aí. O projeto em tramitação no Senado prevê o funcionamento
de apenas 35 cassinos no país, com no máximo três por estado. O deputado
Ricardo Trípoli, do PSDB de São Paulo, que é contra a legalização, questiona o
critério:
"A minha dúvida é a seguinte: será que os
primeiros estados beneficiados seriam os mais paupérrimos do Brasil, como o
Piauí, o Acre, o Amapá, Roraima, Rondônia, ou será que eles pretendem que os
primeiros sejam em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais?"
O
aumento da arrecadação não convence os deputados contrários à legalização dos
cassinos e casas de jogos em geral.
O
deputado Luiz Carlos Hauly, do PSDB do Paraná, que é economista, duvida do
potencial econômico do setor:
"Os lotéricos arrecadam mais de 15 bilhões do
jogo. Oito bilhões vão para o governo. E duvido, desafio qualquer um a debater
comigo, que se legalizar o jogo não dá metade de tributo do que isso. E vai
trazer consequências. Então, vou dizer, é uma falácia, para não dizer que é uma
mentira, que vai dar 20, que vai dar o dobro. Não dá."
O
argumento do aumento da arrecadação também não pode ser usado para justificar a
legalização, de acordo com o advogado Paulo Fernando Melo, do Movimento Brasil
sem Azar:
"Mas quem realmente ganha com a jogatina? Os
ricos investidores cada vez mais ricos e os pobres mais pobres, iludidos que
podem ganhar um dinheiro fácil. Dizer que arrecada dinheiro? O tráfico de
drogas e a prostituição também geram empregos e renda."
A
legalização dos jogos também é criticada pelo Ministério Público. Peterson de
Paula Pereira, secretário de Relações Internacionais da Procuradoria-Geral da
República, diz que existem alternativas para aumentar a arrecadação. Um
exemplo: o combate ao contrabando:
"Pra essa conjuntura, para a necessidade de
criação de empregos, para a geração de renda, para dinamizar esses setores,
talvez fosse mais aconselhável nós darmos condições ao Estado brasileiro com
fiscais para a gente fechar nossas fronteiras para o contrabando, porque penso
que só na eliminação das barreiras e contrabando o efeito econômico e o efeito
do emprego seria muito, muito maior que a legalização dos jogos no
Brasil."
A
expectativa, na comissão especial da Câmara, é de que o relator da proposta,
Guilherme Mussi, do PP de São Paulo, entregue um relatório preliminar para ser
discutido pelos deputados nos próximos dias. (Clique aqui
e ouça a reportagem na Rádio Câmara - Reportagem – Antônio Vital - Edição –
Mauro Ceccherini - Trabalhos Técnicos – Ribamar Guimarães)