O Instituto Brasileiro Jogo Legal
– IJL protocolou nesta segunda-feira (5) no Supremo Tribunal Federal – STF,
Memorial de Sustentação no julgamento do RE 966.177. Admitido em dezembro de
2019 como amicus curiae no julgamento do recurso extraordinário, o IJL é
representado pelo escritório Regis de Oliveira, Corigliano e Beneti Advogados.
No
memorial, que já tinha sido encaminhado para os ministros, o advogado Regis de
Oliveira defende que a Lei das Contravenções Penais é incompatível com “a
principiologia constitucional vigente, que autoriza o controle da
constitucionalidade em seus três aspectos: evidência, justificabilidade e
intensidade. Ofensa, ainda, ao princípio da proporcionalidade e da lesividade,
que veda tanto a proteção insuficiente como a criminalização sem ofensividade.
Por outro, é legítima a opção estatal, no plano administrativo, de não tornar
legal a atividade, sem que tal opção alcance a esfera penal”.
O
advogado destaca o processo de modernização da sociedade e as várias decisões
tomadas pelo Plenário do STF com relação a união estável, aborto do anencéfalo,
rigor em relação à corrupção, reconhecimento do uso das células-tronco,
intervenção na prestação dos serviços de saúde e o reconhecimento de o estado
intervir na política carcerária.
Regis
também destaca que o jogo de azar não é proibitivo ou se constitui em “pecado”
ou em ato ilegal por si só já que foi uma decisão humana que o tornou proibido.
“Outros tempos, outra época. Costumes absolutamente diferentes. Religiosidade
incompreendida e exaustivamente impregnada de conceitos arraigados em sociedade
conservadora”, destacou.
O
representante do IJL, também registra tem se alinhado com o que há de mais
moderno no mundo jurídico e “não pode deixar de reconhecer que o decreto
proibitivo do jogo de azar e que identifica sua realização como contravenção
penal não mais pode subsistir no mundo moderno”.
Também
reconhece que o Brasil é uma grande loteria em que os órgãos estatais ou
credenciados mantêm todo tipo de loteria e jogos. “Publicidade de sites de
apostas e jogos online invadem as residências dos brasileiros nas transmissões
de eventos esportivos. É uma realidade”, revela.
***
Confira a íntegra do Memorial:
EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO LUIZ FUX, PRESIDENTE
DO EXCELSO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, RELATOR DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
966.177/RS.
Recurso Extraordinário nº 966.177/RS
O
INSTITUTO BRASILEIRO JOGO LEGAL – IJL, pessoa jurídica de direito privado
e amicus curiae nos autos de Repercussão Geral no Recurso
Extraordinário n. 966.177/RS em que é RECORRENTE o Ministério Público do Estado
do Rio Grande do Sul e RECORRIDO Guilherme Tarigo Heinz, por seus advogados
abaixo assinados, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência
apresentar
MEMORIAIS
fazendo-o
pela situação de fato e pelos fundamentos de direito a seguir expostos:
01.
Vossa Excelência, sensível às realidades sociais, resolveu atribuir Repercussão
Geral no Recurso Extraordinário n. 966.177/RS que discute a incompatibilidade
do art. 50 da Lei de Contravenções Penais (decreto-lei n. 3.688/1941) perante a
atual Constituição Federal.
02.
O Egrégio Colegiado, ao subscrever o entendimento de dar efeito de repercussão
geral ao recurso extraordinário, suspendeu a prescrição da pretensão punitiva
relativa aos crimes processados nas ações sobrestadas. Fê-lo o Egrégio Tribunal
com absoluta prudência.
03.
O Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em paradigmática decisão
afirmou que o art. 50 da denominada Lei das Contravenções Penais é incompatível
com “a principiologia constitucional vigente, que autoriza o controle da
constitucionalidade em seus três aspectos: evidência, justificabilidade e
intensidade. Ofensa, ainda, ao princípio da proporcionalidade e da lesividade,
que veda tanto a proteção insuficiente como a criminalização sem ofensividade.
Por outro, é legítima a opção estatal, no plano administrativo, de não tornar
legal a atividade, sem que tal opção alcance a esfera penal”
04.
A respeitável decisão que se discute acha-se embasada não apenas em sólidos
fundamentos jurídicos, como encontra base na interpretação sistemática do
direito
brasileiro
ao privilegiar “os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa” (inciso
IV do art. 1º da Constituição Federal).
05.
De outro lado, o art. 170 da Constituição Federal ao cuidar da ordem econômica
funda-se na “valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”.
06.
Vê-se que o trabalho dignifica e a livre iniciativa é livre a todos.
07.
Ora, a atividade lúdica, ao lado de ser saudável e servir de expansão dos
sentimentos humanos, guarda compatibilidade lógica com a atividade empresarial.
08.
O jogo de azar não é proibitivo ou se constitui em “pecado” ou em ato ilegal
por si só. Decisão humana é que assim o tornou. Decisão datada de 1941
(decreto-lei n. 3.688/1941 – jogos de azar) e 1946 (decreto-lei n. 9.215/46 -
cassinos). Outros tempos, outra época. Costumes absolutamente diferentes.
Religiosidade incompreendida e exaustivamente impregnada de conceitos
arraigados em sociedade conservadora.
09.
A sociedade brasileira evoluiu. Outros são os costumes. “O tempora! O mores!”
gritava Cícero da tribuna romana. Na época criticava acerbamente o
comportamento de Catilina.
10.
Hoje a sociedade modernizou-se. O conceito de família já não é o mesmo. A união
estável avançou para sua forma atual, nos termos reconhecidos pela Colenda
Suprema Corte. Esta reconheceu o aborto do anencéfalo. Igualmente, tem agido
com rigor em relação à corrupção que campeia pelo país. Avançou no
reconhecimento do uso das células-tronco. Interveio na prestação dos serviços
de saúde. Determinou ao Executivo que forneça prestação aos desvalidos,
sustentando ser, como determina a Constituição Federal, o direito à saúde um
direito de todos e um dever do Estado. Explicitou a configuração dos efeitos
decisórios. Reconheceu o estado de fato para intervir na política carcerária.
11.
Enfim, a Colenda Suprema Corte revelou-se à altura dos anseios do país.
Alinhou-se com o que há de mais moderno no mundo jurídico.
12.
Esta mesma Corte não pode deixar de reconhecer que o decreto proibitivo do jogo
de azar e que identifica sua realização como contravenção penal não mais pode
subsistir no mundo moderno.
13.
Ademais, não se pode deixar de reconhecer que o Brasil é uma grande loteria em
que os órgãos estatais ou credenciados por este mantêm todo tipo de loteria e
jogos. Publicidade de sites de apostas e jogos online invadem as residências
dos brasileiros nas transmissões de eventos esportivos. É uma realidade.
14.
Não pode a Corte Suprema desconhecer que o jogo é uma realidade do Brasil em
que mais de quatrocentas mil pessoas (400.000) aguardam este julgamento para
adquirirem cidadania, ou seja, deixarem de ser marginais e passarem a integrar
a sociedade brasileira, permitindo-lhes o exercício de uma atividade lícita.
15.
O que surgirá como efeito da decisão da Egrégia Corte, não é apenas deixar de
ser contravenção penal a prática do jogo. Será permitir sua legalização pelo
Congresso Nacional e trazer para o mundo legal os empresários que deixarão de
ser bandidos e marginais para se tornarem empresários do setor de jogos, como registrado nos países mais
ricos do mundo - Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Grã-Bretanha, Itália
e Canadá – onde o jogo é totalmente liberado e regulamentado pelo Estado.
16.
A respeitável decisão a ser proferida legitimará uma sociedade falsa e ilegal
que se refugia da repressão policial para tornar-se uma sociedade de homens de
bem a desenvolver uma atividade lícita.
17.
Indisputável a incompatibilidade da norma repressora com a atual Constituição
Federal e assim deve ser declarada, por força da atipicidade da conduta dos
processados.
18.
As liberdades públicas e individuais não têm sido garantidas, obrigando os
empresários e funcionários que trabalham com as atividades lúdicas a ficarem ao
desabrido de norma garantidora, o que traz à tona a repressão policial de tais
atividades.
19.
Em sendo assim, o INSTITUTO BRASILEIRO JOGO LEGAL, por seu advogado, roborando
a parte principal do feito, vem solicitar seja negado provimento ao recurso
extraordinário para ser mantida a respeitável decisão do colegiado do Rio
Grande do Sul.
É o
que se espera.
De
São Paulo para Brasília, 05 de abril de 2021.
REGIS FERNANDES DE OLIVEIRA
OAB/SP 122.427
ANA PAULA DE Ms. SUCCI
OAB/SP 267.051
Fonte:
BNLData